07/07/2009

Negrilho sem saída


Ulmus minor Mill. - Carvalhos, Vila Nova de Gaia

Este magnífico negrilho faz aqui uma entrada de leão na nossa já abundante lista dos espécimes vegetais (árvores ou arbustos) encurralados pelo progresso. Por «progresso» deve entender-se a imparável progressão do asfalto, que se vem expandindo tentacularmente por todo o território nacional. (Esta ressalva, admito-o, é pleonástica e pedante, pois o vocábulo em causa há muito que para nós não significa outra coisa.)

Na verdade, viver encurralado não é destino assim tão ingrato. O negrilho está no centro de um triângulo arrelvado, num cruzamento de onde parte uma rua sem saída, cortada abruptamente pelos separadores da auto-estrada. O local é o nó dos Carvalhos da A1: quem, vindo dessa freguesia de Vila Nova de Gaia, acede à auto-estrada para se dirigir ao Porto, pode ver a árvore à sua direita, no meio de prédios e casas em desalinho, pouco antes da bifurcação onde tem de optar por uma das pontes sobre o Douro (Freixo ou Arrábida). Não é crível que o nó dos Carvalhos seja remodelado nos próximos anos, ou que alguma nova auto-estrada vá irromper pelo local. A pobre rua amputada onde mora o negrilho nunca terá forças para crescer e se virar contra ele. É pois de supor que a árvore ultrapassou com garbo a ameaça rodoviária que sobre ela chegou a pesar - e que a usou mesmo em proveito próprio, ganhando uma visibilidade como nunca teve e chegando mesmo (ó apogeu da fama!) ao estrelato no Dias com Árvores.

A ameaça maior que o negrilho enfrenta, como todos os da sua espécie e de espécies congéneres (género Ulmus), é a grafiose, que tem dizimado estas árvores pelo mundo inteiro. Agora que restam vivas poucas árvores adultas, talvez a intensidade da praga se tenha atenuado. Vinte e três anos depois de desaparecido o negrilho da Cordoaria, morto o negrilho de S. Martinho de Anta, mortas também as grandes árvores que existiam em Aveiro, o negrilho dos Carvalhos acaba por fazer figura de monumental. Oxalá dure muitos anos.

(Espontâneo na metade norte de Portugal, o Ulmus minor é a espécie do seu género mais comum no nosso país. Os ulmeiros distinguem-se por as folhas serem claramente assimétricas na base; as do negrilho exibem forma ovada-lanceolada, ápice pronunciado e margens grosseiramente dentadas - veja foto aqui.)

2 comentários :

Miguel Soares disse...

Desculpem lá, isto não tem a ver com o post, mas tem a ver com o blog, gostava de ler um comentário vosso: http://www.spiegel.de/international/europe/0,1518,634758,00.html

«Adolf Hitler marked his birthday 67 years ago by planting an oak seedling in the Nazi-occupied city of Jaslo in Poland. Almost seven decades later, the tree is the subject of heated debate as the city mayor, previously unaware of its history, calls for it to be felled.»

bettips disse...

As árvores são boas - não servem para debate nem abate.
Os homens, esses sim, servem para debate e esclarecimento - e não sendo abate, confinamento das suas ideias tenebrosas. Talvez porem uma placa com a lembrança dos milhões de vozes mortas que murmuram pelos seus ramos.
Sempre se aprende alguma coisa com a Natureza...